04 fevereiro 2009

E se com tanta água, um dia a água acabasse?

O que se pede às empresas e às pessoas, face às alterações climáticas, é que poupem um recurso na realidade muito pouco renovável e que implicou elevadíssimos investimentos para ser colocado à disposição. E a mudança que se impõe é a da mentalidade POR GONÇALO CAVALHEIRO* © Ecoprogresso

É incontestável que dos impactes das alterações climáticas os mais fortes se farão sentir na quantidade e qualidade da água disponibilizada tanto para consumo humano como para outros usos absolutamente fundamentais para a vida e para a economia em todo o mundo, tais como a agricultura e indústria.Tanto o projecto SIAM (estudo cientifico sobre impactes das alterações climáticas em Portugal) como os relatórios do Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas (órgão das Nações Unidas que congrega mais de mil cientistas de todo o mundo), apontam claramente que Portugal (no contexto da Península Ibérica) é das zonas do globo em que mais se fará sentir uma redução acentuada da precipitação média anual, que em certos modelos pode chegar aos 30%.Mas atenção que esta redução da precipitação média anual verifica-se apesar da projecção para o potencial aumento da precipitação (em particular no Norte) durante curtos períodos dos meses de Inverno. Assim sendo, a pouca chuva que teremos ser-nos-á disponibilizada, digamos… que toda de uma vez. Depois há que saber gerir, porque os verões serão longos, quentes e secos.As alterações climáticas vão colocar novos desafios a todos os actores: desde a administração (central e local), passando por todos os utilizadores – dos mais intensivos como a agricultura, indústria e lazer, aos menos intensivos, como o consumidor humano. Medidas que até agora só são implementadas em períodos de seca, têm que fazer parte do dia-a-dia, mesmo quando chove muito.O que se pede aqui às empresas e às pessoas é que poupem um recurso na realidade muito pouco renovável e que implicou elevadíssimos investimentos para ser colocado à disposição. E a mudança que se impõe é a da mentalidade. A tecnologia e o que é preciso fazer são medidas conhecidas por todos. Não podemos continuar a construir rotundas, plantar relva e regar a horas impróprias, com mecanismos desajustado e desafinados (aspersores que muitas vezes mais parece estarem a regar a estrada do que a relva); não podemos ter sistemas de distribuição de água com perdas que muitas vezes rondam os 50%; não podemos comprar autoclismos sem mecanismos de redução de caudal, nem máquinas de lavar roupa ou loiça que não economizam água; não podemos lavar o carro com água potável e nem sequer as ruas das nossas cidades; não podemos construir casas sem que estas estejam preparadas para recolher a água da chuva e não podemos esperar investir em sectores económicos intensivos no consumo de água sem que seja exigida a utilização das mais avançadas tecnologias de poupança e utilizações alternativas.A água tem um preço que a legislação comunitária obriga que seja cobrado na totalidade aos utilizadores. A cobrança do custo real é talvez a única forma que temos para garantir que no futuro, a água (ou a falta dela) não represente um custo impossível de suportar – o da sobrevivência das espécies (e quem sabe… da nossa).
*Gonçalo Cavalheiro é Director Técnico da Ecoprogresso